A dação em pagamento envolvendo bens imóveis nas dissoluções societárias
Por: Mariana Marin
A dação em pagamento constitui forma alternativa de adimplemento de uma obrigação, onde o credor aceita receber do devedor uma prestação diferente da que lhe era originalmente devida, podendo haver a substituição, por exemplo, da obrigação de dar quantia pela obrigação de entregar coisa, ou da obrigação de entregar coisa por uma obrigação de fazer. Dessa maneira, tem-se que a natureza jurídica da dação em pagamento é, em regra, extintiva de obrigações.
Ademais, cumpre salientar que o credor não é obrigado a aceitar prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa, nos termos do artigo 313 do Código Civil.
No que diz respeito à dação em pagamento envolvendo o direito imobiliário nas dissoluções societárias, há casos em que os sócios recebem seus haveres (espécie de indenização pela saída da empresa) em bens imóveis pertencentes ao patrimônio da pessoa jurídica, de acordo com sua quota-parte. De tal modo, na posição de credor, encontra-se o sócio que se retira da sociedade, enquanto a pessoa jurídica que está sendo dissolvida ocupa a posição de devedora.
Importante frisar que para que seja possível ao sócio que está se retirando da sociedade o registro do imóvel recebido como dação em pagamento em seu nome, é imprescindível que a dação em pagamento seja também formalizada através de uma escritura pública, de acordo com o artigo 108 do Código Civil, que preceitua que “Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.”
Outro ponto a se destacar é o recolhimento de tributos no que diz respeito aos bens imóveis recebidos em dação em pagamento, uma vez que é sabido que ao ser realizada a transmissão ou cessão de direitos reais, por ato oneroso, de bens imóveis, “inter vivos”, há a incidência do ITBI.
Na hipótese de dação em pagamento fundada na dissolução societária, o artigo 156, §2º, inciso I da Constituição Federal é expresso ao conceder imunidade tributária sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica.
Nesse sentido, observa-se que a imunidade específica nos casos de dissolução societária decorre do fundamento de que não há efetivamente a transferência do bem imóvel, inexistindo, assim, o fato gerador. Isso porque entende-se que o imóvel anteriormente pertencente a pessoa jurídica que está sendo dissolvida, de certa forma, já pertencia ao sócio que está se retirando, na medida de suas quotas sociais na sociedade empresarial, de forma que há somente uma especificação da propriedade.
No entanto, essa regra comporta exceções, sendo certo que haverá a incidência do ITBI quando a sócia retirante que está recebendo o imóvel também for pessoa jurídica que exerça atividade preponderante imobiliária, por expressa previsão do artigo 37 do Código Tributário Nacional e do artigo 156, §2º inciso I da Constituição Federal.
Mariana Marin
Cursando Direito pela Universidade São Francisco de Bragança Paulista, com conclusão projetada para 12/2022.
Experiência na execução de tarefas administrativas relacionadas à rotina jurídica em escritório de advocacia, bem como no ramo bancário imobiliário.
Boa tarde, Dra.
Há fundamento jurídico? Alguma jurisprudência que justifique a não ocorrência do fato gerador?
Boa tarde, Mariana.
A não incidência do imposto neste caso encontra fundamento no próprio artigo 156, § 2º inciso I da Constituição Federal, isto é, restando comprovado que a transmissão do imóvel ocorreu em virtude da dissolução da sociedade – e não sendo o caso da exceção prevista no referido dispositivo legal, deve ser afastada a exigência do ITBI em razão da previsão na Carta Magna.
Este também é o entendimento da jurisprudência pátria, citamos alguns precedentes a título de exemplificação:
Apelação cível e reexame necessário. Mandado de segurança. Incidência de ITBI sobre aquisição imobiliária decorrente de dissolução societária. A sentença concedeu a ordem almejada pela parte impetrante e deve ser mantida. Inteligência do disposto no artigo 156, § 2º, inciso I, da CF. Não há incidência do imposto (ITBI) na hipótese de extinção de pessoa jurídica, quando o adquirente é ex-sócio da empresa e não desenvolve a atividade econômica (preponderante) de compra e venda de imóveis, locação ou arrendamento. Nega-se provimento ao apelo fazendário e ao reexame necessário. (TJ-SP – APL: 10023744620198260053 SP 1002374-46.2019.8.26.0053, Relator: Beatriz Braga, Data de Julgamento: 13/11/2020, 18ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 13/11/2020)
EMENTA: TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA. INCORPORAÇÃO. FATO GERADOR DO ITBI NÃO CONFIGURADO. HIPÓTESE DE IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. 1. O Imposto de Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos (ITBI) incide quando verificada transmissão onerosa entre vivos, a qualquer título, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, sendo de competência dos Municípios nos termos do art. 156, II da CF/88. 2. Não incide o ITBI sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil (art. 156, II, § 2º, I da CF/88). 3. A incidência do ITBI pressupõe um negócio jurídico oneroso celebrado anteriormente por duas pessoas, físicas ou jurídicas, até mesmo no caso de operações societárias, o que inexiste na presente hipótese. 4. Recurso conhecido e provido. (TJ-DF 07057960720208070018 DF 0705796-07.2020.8.07.0018, Relator: ANA CANTARINO, Data de Julgamento: 14/07/2021, 5a Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 26/07/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)
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